Estava cansado demais
para me manter acordado, todavia não conseguia dormir. Mantive-me sentado a
beira da cama, os cotovelos postos sobre os joelhos me conferiam uma leve
curvatura. Não sei por quanto tempo fiquei imóvel. O olhar estava fixo, entretanto
mirava o nada. Eu tinha certeza que toda uma mixórdia ocorria no mundo lá fora,
mas nada ouvia. Parecia estar surdo. Parecia estar mudo. Parecia estar cego.
Não vi quando ela se
aproximou. Leve como sempre, sorrateira como sempre. Apenas me dei conta de sua
presença quando senti o frio.
Ela me abraçou por traz
cruzando seus braços em meu corpo. Senti um arrepio subir pela minha espinha
parando apenas em minha nuca. Em meu pescoço ela roçava seus lábios vermelhos e
vem em vez brincava com mordidas de marfim superficialmente profundas.
Levantei em
sobressalto, minha velha companheira me surpreendeu com sua visita. Apesar de
tudo não esperava aquela antiga amante de volta. Esfreguei os olhos desejando
estar sonhando, desejando acordar logo, mas nada mudou. Fitei-lhe os olhos de
ônix, belos e enigmáticos onde sempre me perdi. Olhos que pareciam zombar de
mim, um olhar que explicitava o quão obtuso eu era, olhos que no silêncio
gritavam o quão enganado eu estava.
Ela sorriu... Um
sorriso tão alvo e perfeito quanto perigoso, um sorriso que seduz à perdição e
esquecimento.
Com calma ajeitou-se na
cama, sem nunca parar de fitar meus olhos e manter o sorriso afável. Estendeu
as mãos em minha direção em um convite silencioso ao qual nunca consegui
resistir. Toquei em suas mãos frias e me aninhei em seu colo, tentei fugir de
seus olhos, mas foi uma luta vã. Quando começou a deslizar seus dedos suaves
como mármore, acariciando minha cabeça, me entreguei de todo a seus carinhos.
“Pobre criança”, ouvi
sussurrar, “não aprendeu e talvez nunca aprenda”, sua voz era pura, sua voz era
puro blues “não importa o quanto
corra, não adianta tentar fugir”, eu estava perdido em seus olhos de ônix,
estava imerso em seu sorriso de marfim, “eu sempre estarei contigo”, então me
vi mergulhado nas profundezas de minha amante e a todo o momento escutava
novamente o blues de sua voz, a todo
instante, como um eco que lá estava apenas para reforçar as suas palavras “eu
sempre estarei contigo”.
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